quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Morreste-me


Ontem de manhã, numa aula de Literacia , o meu professor pediu para lermos uns textos que trouxemos de casa.
Inicialmente, pensei em ler um poema de Eugénio de Andrade, "Adeus", depois decidi levar uns versos do livro "Sementes de Música para bebés e crianças".
Finalmente, acabei por ler aquilo que não tinha programado. Lembrei-me que tinha um texto do José Luís Peixoto no meu portátil e foi o que li.
Cada vez que leio este texto fico muito emocionada e ontem não foi excepção! Acho que o meu professor deve ter-se apercebido...comentou que gostou muito da minha partilha!
Já deixei aqui um excerto desse texto, em 29 de Julho, mas nunca é tarde para reler.
Espero que apreciem " Morreste-me"


"Pai. Deixaste-te ficar em tudo. Sobrepostos na mágoa indiferente deste
mundo que finge continuar, os teus movimentos, o eclipse dos teus gestos. E tudo
isto é agora pouco para te conter. Agora, és o rio e as margens e a nascente; és o
dia, e a tarde dentro do dia, e o sol dentro da tarde; és o mundo todo por seres a
sua pele. Pai. Nunca envelheceste, e eu queria ver-te velho, velhinho aqui no
nosso quintal, a regar as árvores, a regar as flores. Sinto tanta falta das tuas
palavras. Orienta-te, rapaz. Sim. Eu oriento-me, pai. E fico. Estou. O entardecer,
em vagas de luz, espraia-se na terra que te acolheu e conserva. Chora chove brilho
alvura sobre mim. E oiço o eco da tua voz, da tua voz que nunca mais poderei
ouvir. A tua voz calada para sempre. E, como se adormecesses, vejo-te fechar as
pálpebras sobre os olhos que nunca mais abrirás. Os teus olhos fechados para
sempre. E, de uma vez, deixas de respirar. Para sempre. Para nunca mais. Pai.
Tudo o que te sobreviveu me agride. Pai. Nunca esquecerei."

9 comentários:

  1. Olá Carla

    Foi o seu primeiro livro e tocou-me muito aquela interioridade... Nao tiveste tu melhor ideia.

    beijinhos amigos

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  2. Carla,
    Recordo de já ter lido o texto aqui, assim como também o conheço e, como creio que talvez saibas arrepia-me, estou arrepiada e sinto-o bem na pele, porque sei o que é este morreste-me Pai, quem dera não o saber.
    Fizeste uma excelente escolha e, as que também eras para fazer eram igualmente excelentes, mas este por algum motivo especial toca-te e, toca a todos aqueles que conseguem sentir o que aqui está escrito e sentido, assim como o sentido deste livro do José Luís Peixoto. Eu emociono-me sempre que o leio, as lágrimas são inevitáveis.
    Obrigada por o trazeres de novo, nunca será demais.

    Bjo com muita Luz

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  3. Carla,
    Muito obrigada pelo comentário que deixaste num dos meus espaços. És de facto uma pessoa especial e de grande sensibilidade. Aprecio sempre as tuas palavras.
    Acredita que ler este texto não me fez, nem faz mal. Contrariamente ao que possa passar-se com muitas pessoas e, que respeito, eu não fico perturbada ou, incomodada em ler textos como este ou, semelhantes, curiosamente sempre foi um tema que abordei e estudo. Fiz trabalhos sobre o tema e, tenho uma tese que terá o seu dia em que o tema é o Amor e a Morte, é dedicada ao meu Pai.
    Tudo o que toca os afectos, os sentimentos, o nosso lado mais humano, toca-me de uma forma muito forte e intensa e, não tenho medo de falar, só não gosto de ter que falar pelo motivo que foi, esse aí dói muito, mas infelizmente ainda vou ter que falar muito, pois não foi morte natural, há responsáveis. Consegues imaginar a dor, a revolta...
    Só desejo que não saibas tão cedo o que é perder alguém tão importante, eu tinha 31 anos, sei que há quem perca mais cedo e, isso sempre me doeu muito, nunca fui indiferente nem sou à dor dos outros, mas acredita seja em que idade for faz-nos sempre tanta falta.
    Recordo-o todos os dias e, a saudade é imensa, não tem tamanho, mas sinto-me feliz só por saber que foi e, é aquele o meu pai que continua a existir para mim até ao fim da minha vida e, depois da mesma.

    Um beijo muito grande para ti e, obrigada pela sensibilidade, preocupação, doçura e serenidade que me transmites.

    Muita Luz para ti e todos aqueles que mais amas :)

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  4. Olá Carla,
    sem duvida, um dos melhores textos que li sobre o tema.
    Seria certamente o texto que um dia gostaria de escrever...

    Foi bom recordar...

    Abraço

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  5. Olá Carla,
    Tu que também gostas de escrever, não sei se alguma vez passaste pelo meu outro espaço www.animalucemia.blogspot.com..., se quiseres espreita e, aguardo uma opinião tua, é importante :)

    Bjo com muita Luz

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  6. Olá Carla.
    Como já aqui escrivi, gosto de te ler. Não é que tenha muito tempo para Blog´s...
    "Questa Terra ora Crudele", é a tradução desta pequena ficção em Itália, soube-o por um amigo residente nesse lindo país. Tradução que descreve perfeitamente o sentimento que nos possui sempre que nos deparamos com a morte, e a morte de alguém muito querido. Assim como o viveu e vive a minha amiga Luz.
    A Vida é Cruel!!! Esta Terra é Agora Cruel!!!
    Não há volta a dar e só quem vive é que sabe dar o valor. Porém há uma réstia de Esperança, que José Luis Peixoto descreve, a permanência no Universo da Presença de quem parte. A agressão que se refere é esta Sentida Presença.
    Somos o Presente de Todo o Nosso Passado e de Todos os Nossos Antepassados!!!

    E isso Alegra-me!!!
    Beijo e obrigado Carla por mais um momento...

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  7. Olá Carla
    a velhice e a morte são escalões etários de uma vida que se pretende eterna. A eternidade é cósmica e todos nós, no fundo, somos cósmicos o que é um sabor lúcido de sermos o sumo de toda a eternidade.

    03/12/2009 - Jorge Brasil Mesquita
    estou no meu novo blogue: www.gomosdotempo.blogspot.com

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  8. Olá Carla
    a velhice e a morte são escalões etários de uma vida que se pretende eterna. A eternidade é cósmica e todos nós, no fundo, somos cósmicos o que é um sabor lúcido de sermos o sumo de toda a eternidade.

    03/12/2009 - Jorge Brasil Mesquita
    estou no meu novo blogue: www.gomosdotempo.blogspot.com

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